sexta-feira, março 18, 2011

Geração à rasca!

Um dia, isto tinha de acontecer. Existe uma geração à rasca? 
Existe mais do que uma! Certamente! 
Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida.
Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.
A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo. 
Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.

Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.
Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.
Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.

Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego, ... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.

Foi então que os pais ficaram à rasca.
Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem  Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.
Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde  uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.
São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dosqualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.

São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!

A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.

Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.
Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional. 
Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a  informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere. 
Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.
Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.
Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.
Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.
Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.

Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração? 
Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!
Os jovens que detêm estas capacidades-características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem  são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).
Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja!, que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.

E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!

Novos e velhos, todos estamos à rasca.
Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.
Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.
A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la.
Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam. Haverá mais triste prova do nosso falhanço?
Pode ser que tudo isto não passe de alarmismo, de um exagero meu, de uma generalização injusta. 
Pode ser que nada/ninguém seja assim.

(recebido por mail!)

9 comentários:

  1. Anónimo00:30

    Excelente reflexão!

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  2. Anónimo00:32

    Muito similar ao que escreveu sobre os deolindos!

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  3. Dica09:29

    Uma realidade inquestionável que retrata a sociedade portuguesa e que deve meter TODOS a meditar, porque a verdade verdadinha é que estamos todos " À RASCA " e os indicadores políticos tudo levam a crer, que vai ainda aumentar e sem fim à vista nos próximos tempos.

    Quem se lixa ?

    Decerto todos nós que por cá estamos e vivemos !!!

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  4. Anónimo22:12

    Será? realmente esta é uma época complicada... não basta o que foi dito... podemos ir mais além... as utopias, sociedades em que todos somos super-eficientes, super perfeitos e super felizes não existem... a realidade é feita destes putos parvos que perdem a vida em noitadas... e que com sorte acordam um dia... e abraçam o desafio, reconhecendo os esforços dos pais que deram muitas vezes mais do que podiam... mas também é feito DOS INCOMPETENTES EFECTIVOS, multiplicadas ao infinito nos serviços publicos, empresas privadas, negócios grandes, e pequenos, pessoas que não sabem alinhar um pensamento racional após o outro e são "durinhos", o que não os impede de ocupar com "panache" lugares de destaque e encherem o peito quando caminham na rua e passam pela senhora da limpeza, olhando-a do alto da sua altivez... Quem vai então condenar essa mesma senhora da limpeza que se esfola para que os filhos tenham educação??? que se mata trabalhando para que eles um dia não sofram esse mesmo desdem??? Os putos da senhora da limpeza é que por vezes andam de olhos tapados, e não conseguem ver o que está mesmo à frente do nariz... querem só vestir igual aos outros, curtir igual aos outros... Na verdade não existe o tal mundo perfeito, a selva quer que muitos dos sacrificios feitos por quem acredita na ascensao social sejam em vão.... Isso não invalida que por vezes as pessoas sejam lucidas e recebam os tais sacrificios dos pais como uma benção, uma pequena alavanca, que com um pouco de esforço moverá montanhas... A CULPA NÃO E DOS PAIS, QUE NÃO SOUBERAM EDUCAR OS FILHOS E INCULCAR VALORES... A CULPA E DOS FILHOS... QUE SE CONTENTAM COM O SEMBLANTE DE FELICIDADE E DE ESTABILIDADE DA CAMISA RALPH EM VEZ DE DAR VOZ A GERAÇÃO QUE SE SACRIFICOU POR ELES... GERAÇÃO BURRA... DA QUAL FAÇO PARTE POR IDADE... MAS QUE NADA ME DIZ!!!!!

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  5. Qualidade da Democracia22:50

    Os pais fazem como as " galinhas " abrem as asas e cobrem os filhotes como podem e não devem, para os protegerem de tudo e de todos, mas tiram-lhe a capacidade de auto-defesa e poder de iniciativa que eles cada vez mais deveriam ter.

    Por mim falo e como escrever é fácil, e como tremendamente é difícil praticá-lo, os sentimentos paternais são a maioria das vezes bem mais fortes do que as forças da razão, e os resultados em cada família estão à vista, e depois estamos TODOS À RASCA !

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  6. Aqui deixo a minha confissão de "culpa" que me cabe nesta situação!
    Por amor ao meu filho, para que se sentisse feliz e "enturmado" no ambiente que frequentava, fiz sacrificios além do razoável, pelos quais ainda hoje pago até porque a tal felicidade que para ele queria não se compra!!!

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  7. Anónimo03:21

    Concordo com o texto. Sobretudo, no facto da culpa não ser desses jovens a quem deram/dão tudo, menos o que realmente precisam: um emprego. Pelo que, têm toda a razão para reclamar!

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  8. Anónimo18:58

    embora concorde com o que foi escrito, gostaria de colocar algumas questões:
    1ª é culpa dos pais a cena dos recibos verdes?
    2º é culpa dos pais a precariedade no trabalho?
    3º é culpa dos pais a falta de emprego?
    responda quem souber

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  9. Já encontrei a dona do texto: http://assobiorebelde.blogspot.com/

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Respeite as opiniões contrárias! Se todos tivéssemos o mesmo gosto, andávamos todos atrás da sua namorada! Ou numa noite de copos, a perseguir a sua mulher!