No último mês a imprensa tem-nos inundado com a expressão crise financeira, juntando ao léxico um conjunto de anglicanismos que os portugueses não entendem. Mas toda a gente nos dias que é uma qualquer americanice, uma malvadez dos Senhores dos Bancos, movidos por ganância e irresponsabilidade. Provavelmente a culpa também deve ser de Bush, verdadeira encarnação de Judas na era moderna.
Tem sido comovente assistir à propaganda governamental, que enxota a responsabilidade para os Estados Unidos e utiliza a crise como arma eleitoral, a desculpa perfeita para um orçamento fantasioso e eleitoralista! Como seria comovedor, caso não fosse patético, ver nos olhos da esquerda a emoção do alegado fim do liberalismo, o reconstruir do seu Muro de Berlim.
Eu bem sei que é cómodo e simpático colocar as culpas nos outros. E sei bem como em Portugal somos peritos na arte de atribuir aos outros as nossas responsabilidades. E é um facto que os Senhores de Wall Street se colocaram “a jeito” na posição perfeita para a critica fácil: falhou a regulação (de que agora todos falam, mas antes todos silenciaram) construíram-se castelos de areia financeiros, permitiram-se que as renumerações dos gestores se baseassem em pressupostos de produtividade irracionais, que convidaram à fraude, perante a cumplicidade activa e passiva de quem tinha a obrigação legal de fiscalizar. E nada disso deve ser escamoteado: para além de más decisões de gestão, estão mal escondidos por esta crise, comportamentos criminais que têm que ser punidos.
Mas assumido o que fica dito, urge indagar: são os senhores da banca os responsáveis por esta crise? Entendo que não: se eles não estão inocentes, entendo que não são os carrascos!
Ninguém gosta de falar sobre isso, mas o colapso da Banca americana começa quando os clientes deixaram de ter capacidade para pagar os seus empréstimos, tendo a situação agudizado, quando se comprovou o que era óbvio: os americanos não tinham bens suficientes para honrar as suas dívidas. Tal como acontece em Portugal.
Interiorizámos que a economia ia subir eternamente. Apaixonámo-nos pelo crédito e assumimos encargos que não conseguimos suportar: a sociedade de hoje não sabe viver sem carro, telemóvel e plasma, habituámo-nos a fazer férias fora do País, não abdicamos de ir a concertos e festivais de verão, cultivamos o estranho prazer de comprar uma casa mais cara do que podemos suportar, para mantermos a tradição do fado lusitano e rezarmos para que o pouco dinheiro que nos sobra chegue até ao final do mês.
Construímos uma sociedade onde mais importante que ser é o ter: tornámo-nos exibicionistas egoístas, crentes na religião do consumismo, incapazes de suportar privações, cultivando as formas mais simples de ganhar dinheiro, o Deus da era moderna, derrubando pelo percurso princípios como a ética, a solidariedade e a responsabilidade.
Mas a introspecção é luxo complexo e desnecessário: mais simples do que meditar sobre as razões que nos levaram a assumir encargos que não conseguimos suportar é culpar esses malvados dos bancos, que nos deram juros baratos e nos coagiram a comprar uma imensidade de coisas para impressionar os vizinhos e amigos que nem sequer gostamos, para colmatar com bens materiais e prazeres fáceis o imenso vazio da vida quotidiana…
Tem sido comovente assistir à propaganda governamental, que enxota a responsabilidade para os Estados Unidos e utiliza a crise como arma eleitoral, a desculpa perfeita para um orçamento fantasioso e eleitoralista! Como seria comovedor, caso não fosse patético, ver nos olhos da esquerda a emoção do alegado fim do liberalismo, o reconstruir do seu Muro de Berlim.
Eu bem sei que é cómodo e simpático colocar as culpas nos outros. E sei bem como em Portugal somos peritos na arte de atribuir aos outros as nossas responsabilidades. E é um facto que os Senhores de Wall Street se colocaram “a jeito” na posição perfeita para a critica fácil: falhou a regulação (de que agora todos falam, mas antes todos silenciaram) construíram-se castelos de areia financeiros, permitiram-se que as renumerações dos gestores se baseassem em pressupostos de produtividade irracionais, que convidaram à fraude, perante a cumplicidade activa e passiva de quem tinha a obrigação legal de fiscalizar. E nada disso deve ser escamoteado: para além de más decisões de gestão, estão mal escondidos por esta crise, comportamentos criminais que têm que ser punidos.
Mas assumido o que fica dito, urge indagar: são os senhores da banca os responsáveis por esta crise? Entendo que não: se eles não estão inocentes, entendo que não são os carrascos!
Ninguém gosta de falar sobre isso, mas o colapso da Banca americana começa quando os clientes deixaram de ter capacidade para pagar os seus empréstimos, tendo a situação agudizado, quando se comprovou o que era óbvio: os americanos não tinham bens suficientes para honrar as suas dívidas. Tal como acontece em Portugal.
Interiorizámos que a economia ia subir eternamente. Apaixonámo-nos pelo crédito e assumimos encargos que não conseguimos suportar: a sociedade de hoje não sabe viver sem carro, telemóvel e plasma, habituámo-nos a fazer férias fora do País, não abdicamos de ir a concertos e festivais de verão, cultivamos o estranho prazer de comprar uma casa mais cara do que podemos suportar, para mantermos a tradição do fado lusitano e rezarmos para que o pouco dinheiro que nos sobra chegue até ao final do mês.
Construímos uma sociedade onde mais importante que ser é o ter: tornámo-nos exibicionistas egoístas, crentes na religião do consumismo, incapazes de suportar privações, cultivando as formas mais simples de ganhar dinheiro, o Deus da era moderna, derrubando pelo percurso princípios como a ética, a solidariedade e a responsabilidade.
Mas a introspecção é luxo complexo e desnecessário: mais simples do que meditar sobre as razões que nos levaram a assumir encargos que não conseguimos suportar é culpar esses malvados dos bancos, que nos deram juros baratos e nos coagiram a comprar uma imensidade de coisas para impressionar os vizinhos e amigos que nem sequer gostamos, para colmatar com bens materiais e prazeres fáceis o imenso vazio da vida quotidiana…
e eu q não tenho empréstimos ao banco, que não tenho carro ou casa própria (nem outros bens), começo a pensar: sou eu a sortuda, que agora estou na mesma miséria de antes ou sou a parva que não aproveitou a altura das vacas gordas (é assim que se diz?)... hummm
ResponderEliminarna verdade, para ser totalmente sincera, a miséria financeira que é a minha vida tem vindo a agravar-se. e não tenho filhos, casa e carro. e créditos para as férias ou para o plasma... terei eu sido muito esperta por fugir a isso ou fui a burra que não aproveitou? e a culpa? badamerda mais as culpas. essa acaba sempre solteira (como eu desconfio que vou acabar), no entanto as consequências cabem sempre aos mesmos....
Desculpa discordar, amigo H! A culpa É dos bancos! Quem é que faz publicidade até dizer que chega sobre empréstimos? Os bancos! Quem é que TEM os € para emprestar? Os bancos! Quem é que desencandeia processos judiciais se o cliente não consegue pagar os créditos? Os bancos! Para mais, os bancos emprestam "apenas" à aqueles que têm garantias para poderem lucrar até nisso se o cliente falhar! Os bancos têm a faca, o quejo e o pão na mão! Agora, claro, são os "coitadinhos" e querem ser ajudados! Realmente...
ResponderEliminarCara moi chéri, você vive?
ResponderEliminarPelo que vejo, não tem namorado, não tem filhos, não tem casa, não tem carro, não tem plasma, não tem dinheiro e nem um creditozinho...
Então tirando escrever em blogs você vive?
Anónimo:
ResponderEliminarA moi chéri, para viver não precisa de um namorado nem de filhos nem de casa própria e nem de carro, certo?
Ou será que só começamos a viver quando reunimos estas coisas todas???
Sendo assim, eu tb não vivo! Ainda me faltam umas quantas!
caro anónimo das 10h22:
ResponderEliminaré óbvio (para mim) que o facto de não ser casada, de não ter filhos, plasma ou férias na república dominicana me impede ter uma vida. daí escrever blogs. é uma forma que me parece saudável e eficaz de destilar toda a minha frustração por não corresponder ao estilo de vida de 90% da população. de não corresponder à ideia de que temos todos de tomar as mesmas opções de vida, porque essas são (óbvia e inquestionavelmente) as correctas.
porque sou extremamente infeliz porque não tenho plasma e vejo filmes num ecran mínimo sem sistema de som surround espalhado pela sala (que nem é minha), porque o carro em que me desloco não tem ar condicionado nem jantes de liga leve, porque as férias são raras e por norma aqui pertinho... escrevo blogs.
e você anónimo? tem tudo o que precisa? ou ainda lá vai com mais um créditozinho?
@zig - quando enviei a crónica para publicação no site da RPax, juntei um comentário que dizia "é desta que sou linchado"!
ResponderEliminarBem sei que o que digo não é popular e vai contra a vox populi. Mas, a concepção que tenho da vida e da sociedade, não me permitem pensar que "coitadinho" do consumidor que é manipulado pela Banca. Sou mais exigente que isso os cidadãos.
Por fim, uma breve nota: não acho que a Banca em Portugal precise de "ajuda": a razão de ser do Aval é permitir à Banca contrair empréstimos no estrangeiro para emprestar dinheiro aos cidadãos. Sem o aval, o mercado seria um exclusivo das pessoas com mais capacidade para cumprir, com mais e melhores garantias!
Olha, a conversa que já aqui vai! Pois bem, também não tenho carro (paguei para já não ter, mas isto é uma looonga história...), não tenho casa (já tinha...) e não tenho namorada (pelas razões acima descritas, logicamente) e também vivo...
ResponderEliminarH:
ResponderEliminarO que acabei de escrever não é sobre a tua resposta ao meu comentário, escrevemos aqui quase ao mesmo tempo.
Popular ou não, é um ponto de vista que merece discutir, e é isso que tu aqui fazes, dás temas para serem discutidos!
moi chéri:
Então, e aquela bolha de asfalto de cor roxa?
Brilhante crónica!
ResponderEliminarPL
Estamos a atravessar o pior pânico financeiro de muitas décadas. Agora existe um novo princípio, é o princípio da “instabilidade financeira”.
ResponderEliminarCom este novo princípio e a falta de confiança existente nos vários sectores de mercado, todo o sistema financeiro e o modo como este opera deveriam ser reconstruídos “radicalmente”.
Só existe um modo de aliviar/travar??? rapidamente esta crise, através de uma maior intervenção dos Estados.
Há que regulamentar urgentemente novas medidas, há que tomar medidas intervencionistas a fim de repor os níveis de confiança, senão…..
p.s. quanto aos cidadãos que não conseguem cumprir com as responsabilidades assumidas, se calhar só lhes resta utilizar uma medida ao alcance das empresas, declarar falência!
Caro H,
ResponderEliminarOlha a Bola de Berlim!...
É certo que existe (i)responsabilidade daqueles que contraíram créditos com orçamentos à justa e sem grande segurança no futuro, mas a Banca também foi irresponsável. A Banca sabe muito bem que a economia faz-se de ciclos económicos. Se um banco concede crédito a um cliente, que num ciclo económico de juros históricamente baixos, fica sufocado com esse crédito, não é de esperar outra coisa senão problemas sérios quando o ciclo inverter! Milhares destes créditos juntos deram no que hoje já todos sabemos.
ResponderEliminarSubscrevo o comentário do hpalma na integra.
ResponderEliminarSubscrevo o comentário do hpalma na integra.
ResponderEliminarSubscrevo o comentário do hpalma na integra.
ResponderEliminarMeu caro h, espere pela pancada que não vai sem resposta. Não agora que estou um pouco mal, mas você colocou-se mesmo a jeito.rrssss Deixou-me até um pouco frustrado porque pensei que com aquilo que escrevi sobre este tema tinha acordado o homem de esquerda que está adormecido dentro de si.rrrss M&M
ResponderEliminarDiscordo que diz, mas reconheço que é uma visão com alguma lucidez e inteligência. Curiosamente similar ao que ouvi hoje do Cardeal Patriarca!
ResponderEliminarPorque em vez de culpar os bancos não a colocam em quem faz publicidade para vender os produtos que levam a malta a pedir emprestimos para os comprar? ou na televisão, rádio, jornais, etc que a transmitem?
ResponderEliminaralgumas pessoas insistem em culpar quem lhes interessa, ideologicamente, culpar!
se um tipo dá um tiro noutro a culpa é: de quem fabrica a arma, de quem lha vendeu, da sociedade que o exclui, do governo porque á poucos policias, do tipo que leva o tiro porque não se desviou... de todos menos de quem aperta o gatilho!
MUITISSIMO BOM!
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