sábado, maio 24, 2008

Malangatana

Escrevo estas linhas quando um temporal desaba sobre a cidade, recorda-nos da nossa impotência contra os deuses da chuva, que transformam a Primavera numa efeméride irreal, linhas de um mal desenhado calendário, falível como muitos dos que nos rodeiam!
O corpo anseia pelos prazeres do calor, pelo que convido o leitor a viajar ao encontro das cores quentes africanas. Ofereceu-lhe Malangatana, o pintor mais proeminente do povo Moçambicano, povo sofrido, quer na pátria mãe, quer por estes dias numa Africa do Sul que esqueceu o terror do apartheid!
Nascido em Junho de 1936 na Província de Maputo, abandonou cedo a escola para dedicar-se a todas as profissões possíveis, de criado de miúdos a pastor de gado, aprendiz de feiticeiro a apanhador de bolas num clube colonial de elite! Inconformado com o colonialismo opressor, a sua luta pela libertação do seu povo, valeram-lhe dois anos de prisão, não obstante nunca ter sido condenado! Mas a prisão não lhe esbateu o apelo cívico, tendo nos primeiros anos após a independência procurado contribuir! Até que o apelo das artes foi irresistível, recentrando a sua vida na veia artística!
Malangatana é um poliglota das artes: exímio pintor, entrega-se ao desenho e às aguarelas, teve paixão por murais, encontra na escultura uma forma de expressar a sua arte, aprecia a cerâmica e não temeu expressar-se na tapeçaria! Como passou pela poesia e pelo palco!
Escolho um quadro que me recorda Ensor, embora o cinismo deste se esbata num desenho abstracto, que encontra expressão nos rostos inexpressivos, fechados sobre si, simulando emoções que não podemos ver, apenas adivinhar! As cores, são africanas, quentes, sensuais, lascivas, quase proibidas, muito inatingíveis, pintadas com um mistério sofrido! Mas com esperança! Com a certeza que a vida lhe deu, que por mais sofridos que sejam os dias e as noites, um dia um eterno sol vai brilhar, derretendo o gelo da amargura e da infelicidade! Como as chuvas de Maio, também o receio infeliz não molha eternamente…

3 comentários:

  1. Anónimo01:23

    Mais um excelente quadro, mais um excelente texto!

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  2. Anónimo01:09

    Uma optima escolha!

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  3. Anónimo18:32

    Ele me conhece de menino e eu gosto dele como um bom amigo. Muito bom vê-lo por aqui!

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